É certo que durante as epidemias, a exemplo da que ora vivenciamos em decorrência da COVID-19, alguns direitos individuais podem, temporariamente, sofrer restrições em face da predominância dos interesses sociais envolvidos, sobretudo se considerarmos que já foi reconhecido o estado de calamidade pública em todo o país por meio do Decreto Federal nº. 6/2020, em vigor desde o dia 20 de março.
Uma dessas restrições, ocorrida em âmbito estadual, foi levada a efeito por meio da Portaria nº. 038-R, de 20 de março de 2020, da Secretaria de Estado da Saúde do Estado do Espírito Santo, que determinou a suspensão das visitas hospitalares no âmbito estadual do SUS, enquanto durar o estado de emergência, senão vejamos:
Art.4º Suspender as visitas hospitalares, enquanto durar o estado de emergência.
§1° Nos casos autorizados por lei ou norma específica, será garantida a presença de 01 (um) acompanhante junto ao paciente de enfermaria.
§2° Fica expressamente proibida a entrada de acompanhantes com sintomas gripais.
§3° Os acompanhantes dos pacientes internados com quadros respiratórios deverão obrigatoriamente usar Equipamento de Proteção Individual (EPI) aplicável, a ser disponibilizado pela unidade hospitalar. (Grifo nosso)
A portaria acima referida, cuja aplicação se limita ao âmbito estadual do SUS, embora tenha restringido as visitas hospitalares, determinou que seja assegurada a presença de 01 (um) acompanhante junto ao paciente de enfermaria, quando houver autorização em lei específica, sendo esse o caso da parturiente.
De acordo com o art. 19-J, da Lei nº. 8.080/1990, “Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde – SUS, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.”.
No intuito de compatibilizar a referida obrigação com o cenário atual, o Ministério da Saúde editou a Nota Técnica nº. 10/2020-COCAM/CGCIVI/DAPES/SAPS/MS, por meio da qual recomendou o seguinte – sem fazer distinção entre instituições públicas e privadas:
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ORIENTAÇÕES PARA SALA DE PARTO (PARTO E NASCIMENTO)
Acompanhantes: garantido pela Lei Federal nº 11.108, de 7 de abril de 2005, sugere-se a presença do acompanhante no caso de pessoa assintomática, com idade entre 18 e 59 anos e não contato domiciliar com pessoas com síndrome gripal ou infecção respiratória comprovada por SARS-CoV-2.
ORIENTAÇÕES PARA O ALOJAMENTO CONJUNTO
Acompanhantes e visitantes: naqueles locais onde os espaços de alojamento conjunto são compartilhados, sugere-se suspender visitas e a presença de acompanhante, como medida de redução da aglomeração e proteção à mãe e recém-nascido internados.
Nos locais em condição de promoção do distanciamento entre os internados, ou com acomodações privativas, recomenda-se a manutenção de acompanhante único, regular, desde que assintomático, com idade entre 18 e 59 anos e não contato domiciliar de pessoa com síndrome gripal ou infecção respiratória comprovada por COVID-19.
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ORIENTAÇÕES PARA UNIDADE NEONATAL (UTIN, UCINCo, UCINCa)
Observe-se que mãe e pai sintomáticos ou contatos domiciliares de pessoa com síndrome gripal não devem entrar na UTIN/UCINco até que o período de transmissibilidade da SARS-CoV-2 tenha se encerrado (14 dias).
Sugere-se a realização de triagem diária para sintomatologia respiratória e síndrome gripal para pais e mães que visitam bebês em UTIN/UCINco.
Recomenda-se que as instituições avaliem a suspensão da entrada nas UTIN, UCINCo, UCINCa de qualquer outra pessoa além do pai ou da mãe, ainda que assintomáticas e que não sejam contatos domiciliares com o intuito de evitar aglomerações nas unidades.
Excepcionalmente, em caso de total impossibilidade do acesso e/ou permanência do pai e da mãe (óbito, internação prolongada na UTI), a família poderá indicar um(a) cuidador (a) substituto(a) assintomático com idade entre 18 e 59 anos e que não seja contato domiciliar de pessoa com síndrome gripal ou infecção respiratória comprovada por SARS-CoV-2 que possa acompanhar o recém-nascido.
As recomendações acima transcritas, vale ressaltar, não diferem daquelas estabelecidas pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado do Espírito Santo, por meio da Nota Técnica Covid-19 nº. 13/2020 SESA/SSAS/GROSS/NEAPRI-REMI.
Temos, então, que regra geral deverá ser assegurada a presença do acompanhante (assintomático, com idade entre 18 e 59 anos e sem contato domiciliar com pessoas com síndrome gripal ou infecção respiratória comprovada por SARS-CoV-2) durante o trabalho de parto, parto, bem como no pós-parto imediato, desde que esse último se dê em acomodação privativa ou em local que permita o distanciamento entre os internados.
Por outro lado, caso a paciente em pós-parto esteja em acomodação compartilhada, a orientação é que se suspenda a presença do acompanhante.
Caberá, portanto, ao Diretor Técnico, considerando as peculiaridades da instituição e do setor em que a gestante/parturiente está internada, regulamentar o direito ao acompanhamento, levando sempre em consideração que o referido direito é assegurado por lei, de modo que eventual restrição deve ser excepcional e devidamente fundamentada, com vistas ao atendimento do interesse da coletividade.
Vitória-ES, 28 de abril de 2020.
Dr. Paulo Gouveia
Comitê de Crise no Enfrentamento do Coronavírus – CRM-ESÂÂ
Dr. Celso Murad
Presidente do CRM-ES